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A MISÉRIA DA INOVAÇÃO

Cena 1:

Empresa de grande porte promove hackathon, reunindo alguns grupos de geeks e similares em um espaço onde ficam confinados por 24 horas com o objetivo de criar um “app inovador”. Para a equipe vencedora, os organizadores se propõem a pagar 5 ou 10 mil reais (em troca do direito sobre a ideia que se pretende que traga milhões à organização). Ao final da jornada, em meio à fedentina da falta de banho e às olheiras generalizadas, nenhuma equipe conseguiu apresentar grande coisa.

Cena 2:

Start-up moderninha instala mesas de ping pong, piscina de bolinhas e vídeo games em seu escritório. Bonequinhos da franquia Star Wars não foram esquecidos. Nos anúncios de vagas, estes itens de “qualidade de vida no trabalho” são enaltecidos, mas o turn-over e a dificuldade em conseguir gente cresce desenfreadamente.

Cena 3:

Instituição de porte inicia programa corporativo de inovação, com instituição de grupos, comitês e uma infinidade de reuniões para priorização e análise crítica de ideias. Cada sessão envolve dezenas de pessoas e há ideias que estão sendo discutidas há meses. Em meio a isto, um concorrente lança um produto novo exatamente correspondente a uma das ideias em trâmite, deixando o CEO furioso e se perguntando “por que estou pagando esta estrutura de inovação toda se as ideias ficam paradas nos fóruns e a concorrência lança na frente?”

Os três panoramas acima expressam o fenômeno da avacalhação na adoção de movimentos estruturados de inovação.

Este fenômeno de má implementação e franca grosseria não é exclusivo desta onda de design thinking, lean start-ups e implementação de “tecnologias disruptivas” à moda tupiniquim. Outras ondas, como a dos sistemas de gerenciamento da qualidade, dos modelos de maturidade em desenvolvimento de software, do gerenciamento de projetos e da própria adoção do ágil já foram laureadas com uma miríade de pantomimas.

Apenas para ilustrar, listo abaixo mais algumas disfunções vistas na prática em programas de inovação:

1 – Algumas contribuições não são ideias candidatas a inovação em si, mas sim enunciados de problemas, desejos reprimidos ou queixas das pessoas da organização.

2 – O programa de inovação pode ajudar a exacerbar conflitos interdepartamentais.

3 – Um grupo de inovação pode focar-se em gerar ideias somente para os outros, ou simplesmente dizer que “o problema são os outros”, como se não houvesse nada a melhorar localmente.

4 – No repasse de ideias de um polo a outro, pode haver problemas de “empurra-empurra” ou animosidades quando à aceitação de ideias “estrangeiras”.

5 – Sempre há o risco de haver análises críticas prematuras sobre as ideias.

6 – Os núcleos de governança e de mobilização podem ter dificuldade em manter “neutralidade” quanto às ideias geradas.

7 – Um contribuidor individual ou um grupo pode gerar uma ideia e depois não querer defendê-la ou levá-la a cabo (“gerei a ideia, mas não sou eu que tenho de por a mão na massa por ela”).

8 – A atuação da direção no âmbito do programa de inovação pode dar margem a pontos delicados:

·        Risco de ocorrer reações na hierarquia que bloqueiam a geração de ideias (indignação com alguma ideia, imposição, manipulação, censura ou deliberada apropriação da ideia)

·        Governança posar de “espião delator” no trânsito entre a direção e os grupos de inovação, revelando os conflitos subliminares entre os silos

·        Direção querer tirar uma ideia do sistema de inovação, colocando-a em outra rotina de forma atabalhoada (por exemplo, solicitando uma “fast lane” para ela, quebrando o necessário fluxo de análise)

9 – A premiação por geração de ideias pode, se não for concebida cuidadosamente, gerar disfunções:

·        Conflito entre Ideias individuais e ideias de um grupo

·        Combate a ideias de outros grupos

·        Foco no volume puro e simples de ideias

10 – Algumas ideias podem ser na verdade pedidos de permissão para realizar algo que já deveria estar sendo feito sem precisar da “benção” de ninguém.

11 – Algumas ideias podem ser do tipo “só coloquei isto porque precisava gerar ideias.”

12 – Algumas ideias podem ser do tipo “empurracionista” (“resolver o problema através da contratação de um especialista neste tipo de problema”).

13 – Ideias paradas no fluxo de análise ou tramitando muito lentamente, em meio a discussões academicistas sem fim.

A inovação e seus programas são uma necessidade real em grandes organizações, mas a implementação amadora é um perigo que pode jogar mais um assunto precioso na vala comum. Que isto seja alvo de cuidadosa reflexão.

 

Roberto Pina Rizzo
Lean Agile Change Agent
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